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A produção de alimentos é fator essencial para a saúde e para a manutenção da paz mundial e o Brasil é um importante player no cenário global na missão de alimentar o mundo. Essa foi a conclusão central dos debates realizados durante o “Seminário Alimentos Seguros”, promovido pela AEASP – Associação de Engenheiros Agrônomos do Estado de São Paulo, na segunda-feira, dia 22/06.
O evento online reuniu, durante todo o dia, lideranças do setor, representantes de instituições públicas, privadas, cooperativas e profissionais que atuam na área de alimentos que esboçaram as perspectivas para os próximos anos e analisaram o cenário atual da produção de alimentos no país e no mundo, além das tendências e desafios para a indústria alimentícia no mundo pós-Covid-19.
Para o presidente da AEASP, João Sereno Lammel, que fez a abertura do evento, o que é relevante não é somente a produção de alimentos em quantidade, pois o Brasil segue avançando para atender as demandas crescentes do país e do mundo. “Precisamos nos preocupar com a qualidade e a sanidade dos alimentos. A exigência da sociedade com a questão já vinha crescendo e certamente será ainda maior com surgimento da Covid-19. O importante é que todos os sistemas de produção sigam rigorosamente os critérios preconizados a cada um deles”, enfatizou.
Para o presidente da Abramilho – Associação Brasileira dos Produtores de Milho e ex-ministro da Agricultura, Alysson Paolinelli, o desafio de alcançar a produção de 600 milhões de toneladas de alimentos até 2050 é perfeitamente alcançável. Este foi um dos aspectos abordados no primeiro painel “A produção de alimentos no Brasil”.
“Se hoje produzimos 250 milhões de toneladas e precisamos chegar a 600 milhões até 2050, a pergunta é se isso é possível. Perfeitamente possível, pois temos seis tipos de biomas e estamos fazendo grande esforço com ajuda da Embrapa, das universidades, do governo para que, conhecendo os nossos biomas e seus limites, possamos explorar cada um deles de forma adequada”, apontou. “Os países desenvolvidos usaram seus biomas de forma descontrolada, agora ‘reclamam’ de nós para que sejamos o pulmão do mundo. Não existe isso. Cada um tem que fazer o seu papel. Nós iremos fazer o nosso e vamos oferecer ao mundo alimentos com consciência, competência e segurança de forma que eles possam significar uma mudança profunda na vida e na alimentação do mundo”, enfatizou.
Paolinelli fez ainda uma análise da história da produção agrícola brasileira e reforçou a mudança na trajetória do Brasil do papel de importador para exportador de alimentos. “Há apenas quatro décadas, o Brasil passou de importador de alimentos para um grande exportador para o mundo, alcançando a primeira posição em vários produtos como soja, açúcar, café, suco de laranja, além de crescer também a exportação em carne suína e milho. O agro contribuiu com U$ 96 bilhões na exportação em 2019 e já exportou U$ 42 bilhões nos primeiros cinco meses deste ano”, resssaltou.
Controles e tendências no setor de alimentos
Apesar de cada vez mais aprimorados os controles mundiais na produção de alimentos, os índices de mortalidade devido ao consumo de produtos inapropriados pela população mundial são alarmantes. Segundo a OMS (Organização Mundial da Saúde) são estimados 600 milhões de doentes/ano, 420 mil mortes/ano, 125 mil mortes em crianças com menos de cinco anos em decorrência do consumo de alimentos não seguros.
Os dados foram apresentados pela superintendente estadual do MAPA – Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Andréa Figueiredo Procópio de Moura, no segundo painel do dia denominado “Controles e tendências no setor de alimentos”. Segundo ela, o dever da proteção da saúde da população é do Estado e isso se faz pela oferta de alimentos de qualidade. “Segurança alimentar e alimentos seguros são dois assuntos dessociáveis. O consumo de alimentos inseguros cria um circulo vicioso de doenças, afetando principalmente as populações mais vulneráveis como idosos, crianças e doentes. Por essa razão, o Brasil, como grande produtor de alimentos precisa ter um controle efetivo, um padrão de segurança do que produz. Tanto para sua própria população, como também para outros consumidores a quem nossos produtos chegam. Dessa forma, os controles do Ministério abrangem todas as fases desde a fase da produção dos insumos, agropecuária, industrialização até exportação”, explicou.
A superintente destacou as iniciativas desenvolvidas no setor de defesa agropecuária, aliadas à tecnificação e transformação tecnológica para que o Brasil pudesse assumir o protagonismo na produção alimentos. “Uma dessas iniciativas foi a revisão do marco regulatório, adotando instrumentos voltado à melhoria da qualidade regulatória, bem como transparência e maior participação social”, apontou. Ela também abordou os aprimoramentos de controle, como a fiscalização, com racionalização dos recursos humanos e materiais, direcionada aos produtos e processos que têm maior risco de contaminação e estabelecimentos que já possuem histórico de perda de controle.
Questionada sobre o processo da implantação da rastreabilidade no setor de hortifruticultura, Andrea informou que, devido o cenário atual, o prazo do calendário teve que ser revisto e sofrerá um atraso. “Pela capilaridade da cadeia existe muita dificuldade na implementação. A segunda fase que estava prevista para agora terá um atraso devido o momento que estamos vivendo, pois o trabalho junto aos produtores ficou prejudicado”, explicou.
Consumidores querem saber o que está além da embalagem
De acordo com a pesquisadora Marta Taniwaki, do ITAL – Instituto de Tecnologia de Alimentos, a mudança do comportamento humano ao longo dos anos refletiu também no padrão de consumo dos alimentos. O aumento de opções e maior acesso aos mercados estão impulsionando a demanda por uma gama diversificada de alimentos.
Segundo ela, os consumidores buscam por alimentos altamente sensoriais, saudáveis e de fácil preparo. Entretanto, eles também querem saber como é a origem e o processo de produção do que consomem: uma megatendência global.
“Hoje, o consumidor tem o direito de saber o que tem dentro da embalagem, mas também como esse alimento foi produzido. Se foi produzido respeitando as regras ambientais, as emissões de gases e, no caso de produto animal, se houve a prática do bem-estar animal. Também há um aumento de demanda por alimentos éticos, produtos sazonais cultivados localmente e sustentáveis. As percepções do consumidor de alimentos não seguros levam ao desperdício”, reforçou.
Representando a ABIA – Associação Brasileira da Indústria de Alimentos, o Diretor de Assuntos Regulatórios e Científicos da entidade, Alexandre Novachi, falou sobre o futuro da produção de alimentos e o papel fundamental da ciência para o desenvolvimento de pesquisas e novas tecnologias na busca do equilíbrio entre alta oferta/produção de alimentos x segurança alimentar.
“O momento que estamos hoje é um ponto de reflexão: para onde vamos a partir de agora? Muito se fala do novo, mas será que é tão novo assim? A tendência é buscarmos o equilíbrio entre a oferta de alimentos e o alimento seguro. E definitivamente é a ciência que vai nos garantir isso hoje e amanhã, assim como garantiu no passado. O que vamos comer amanhã? A resposta para essa pergunta depende das escolhas que faremos hoje, de quais são as nossas prerrogativas e os novos valores”, disse.
Sobre o desenvolvimento de alimentos em laboratório com as chamadas foodtechs, Novachi apontou que não vê como um mercado concorrente ao tradicional, mas uma opção a mais aos consumidores. “Não vejo uma disputa entre um alimento e outro. Apesar desses produtos serem apresentados em algumas situações específicas, sejam elas fisiológicas ou questões ideológicas, também se posicionam no mercado como uma opção a todos os consumidores. Esses produtos não são para substituir o tradicional ou para atender apenas um nicho. Uma pessoa qualquer pode optar por alimentos que contenham essas características. É, sim, um aumento de possibilidades”, salientou.
O diretor da ABIA ainda reforçou que é saudável a “concorrência” com os alimentos inteligentes ou smartfoods, pois a crescente demanda por alimentos e o uso de plataformas de comércio eletrônico estão impulsionando a criação de cadeias de suprimentos mais enxutas, mais ágeis e com menos desperdícios.
Os painéis do período da manhã tiveram ainda como debatedores o presidente da AEAMS – Associação dos Engenheiros Agrônomos de Mato Grosso do Sul, Antonio Luiz Neto Neto e o presidente da FEAPR – Federação dos Engenheiros Agrônomos do Paraná, Clodomir Luiz Ascari. A mediação ficou a cargo do professor da FEA-USP, Decio Zylbersztajn.
Tecnologia e segurança alimentar
As startups de alimentação, conhecidas como foodtechs, voltaram ao centro do debate no quarto painel do Seminário. O modelo de negócio, que visa pensar na aplicação da tecnologia para melhorar a agricultura e a produção de alimentos, sua cadeia, os canais de distribuição e o consumo ganhou ainda mais força, no Brasil e no mundo, com os debates sobre a segurança alimentar durante a pandemia.
O diretor de Inovação do MAPA – Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Cleber Oliveira Soares fez uma explanação sobre o mercado atual, desafios e tendências, destacando a importância do agronegócio para a segurança e o fornecimento de alimento para a população mundial.
“Os consumidores estão cada vez mais exigentes e buscando estar próximos das cadeias de produção. Não tenho dúvidas de que o futuro da produção de alimentos passa pelas foodtechs, as quais, por meio das pesquisas e do uso de tecnologias, agregam valor às cadeias produtivas do agronegócio”, destacou.
O painel contou com a participação do presidente da Sociedade Mineira dos Engenheiros Agrônomos (SMEA), Emilio Elias Mouchreck Filho e da presidente da Associação dos Engenheiros Agrônomos do Estado do Rio de Janeiro (AEARJ), Ana Paula Guimarães de Farias, que ressaltaram a importância da formação técnica dos profissionais do campo e a convicção da necessidade de expandir o conhecimento para além do ambiente técnico. A mediação foi feita pelo consultor Ivan Wedekin, da Wedekin Consultores.
Panorama da produção de alimentos no mundo
O ex-Ministro Roberto Rodrigues, coordenador do FGV Agro, destacou, no segundo painel da tarde, o tema “Alimentos no Mundo”, seguido de um debate com a participação dos mesmos integrantes do painel anterior. Rodrigues destacou o papel fundamental do Brasil na produção e fornecimento de alimento para diversos países, evidenciando que, mesmo com a pandemia, o país foi o único que registrou aumento de exportação de alimentos no mundo.
“O agronegócio brasileiro foi capaz de se organizar e registrar resultados positivos em meio à crise. O campo não parou. Esse movimento trouxe ao cidadão urbano uma nova visão sobre a atividade, principalmente quanto à importância da agricultura para a segurança alimentar”, evidenciou.
“A pandemia mostrou ao mundo que a régua da sanidade estava muito baixa e fez com que essa questão ganhasse uma nova importância. Não tenho dúvidas de que o setor tem feito a sua parte e, se trabalharmos o equilíbrio, sairemos dessa crise ainda mais fortalecidos”, acrescentou.
Biosseguridade é fundamental para obter alimentos seguros
Investir em biosseguridade é uma medida-chave para conter a propagação das enfermidades animais e, consequentemente, obter segurança alimentar, melhor qualidade de alimentos e prezar pela saúde humana. Na mesa redonda “Alimentos Seguros”, o consultor e ex-secretário de Agricultura do Estado de São Paulo, Francisco Sergio Ferreira Jardim enfatizou a importância da biosseguridade na pecuária e de empenhar trabalho em barreiras sanitárias, usando como exemplo o problema da peste suína na China, país possui metade do rebanho mundial (684 milhões de suínos) e já exterminou mais de 134 milhões de cabeças em função do surto de PSA. “Precisamos fazer a prevenção de entrada de animais doentes, adotar medidas preventivas de manejo e seguir os calendários sanitários. Só assim conseguimos mitigar e eliminar doenças que podem comprometer a biosseguridade”, reforçou.
O presidente da OCESP – Organização das cooperativas do Estado de São Paulo, Edivaldo Del Grande, presidente da OCESP, reforçou a importância do trabalho desenvolvido pela entidade e o empenho para manter a seguridade nos alimentos comercializados. Ele ressaltou que uma das formas de se conseguir maior controle sobre a segurança dos alimentos é por meio do trabalho das cooperativas. “Cooperativismo e alimentos seguros estão juntos. Um exemplo da relevância da atividade no Brasil é que 53% de toda safra de grãos provém de cooperativas e 22% é armazenado por elas”, pontuou.
Megapotência alimentar e produtiva
Para o presidente da Associação Brasileira de Agronegócio – Abag, Marcello Brito, com as mudanças de comportamento entre as gerações, as novas tendências de mercado e consumo vão exigir cada vez mais uma produção sustentável.
“Os estudos no mundo mostram que a geração X já tinha uma visão de produção em relação à geração anterior, acelerada agora pela geração dos millennials, que acreditam no novo normal, pensam na produção sustentável, nas emissões de carbono e no bem-estar animal. Cada vez mais isso vai ser cobrado”, apontou.
“O Brasil é uma megapotência alimentar e agro ambiental. É preciso que assumamos o nosso protagonismo. Se a pandemia nos desconectou, o relacionamento virtual nos conectou em apenas três meses. O que a ciência foi capaz de fazer em apenas 90 dias? Que saibamos aproveitar nossas vantagens competitivas”, finalizou.
O painel de encerramento foi protagonizado por um debate entre os ex-Ministros da Agricultura Alysson Paolinelli e Roberto Rodrigues, com a participação do presidente da AEASP, João Sereno Lammel.
As mais de oito horas de conteúdo do ‘Seminário Alimentos Seguros’, que foi promovido pela AEASP, com o apoio do Conselho Federal de Engenharia e Agronomia do Estado de São Paulo – CREA-SP e colaboração da Confederação dos Engenheiros Agrônomos do Brasil – CONFAEAB estão disponíveis no canal da AEASP no Youtube (https://www.youtube.com/channel/UCaQI9PYrT6h9zPd-Yzr9W3g) e no do Sistema Ocesp, que fez a retransmissão (https://bit.ly/SeminarioAlimentosSeguros).